quinta-feira, 23 de maio de 2013

A minha Maria não é bonita. É linda.



Como diz o título minha Maria não tem nada de Maria Bonita, não é do cangaço, não é bruta, violenta, não enfrentou batalhas com a peixeira na mão, não degolou cabeças no sertão do nordeste.
Minha Maria não é bonita, é linda! E por muitas razões. Ela é doce, tranquila, meiga, distraída, tímida e discreta.
Encontrei ela limpando a porta da vizinha. Puxei papo e perguntei se ela tinha alguns dias vagos, porque tinha acabado de me casar, mudar e precisava de uma ajudante.
Acertamos tudo e logo ela passou a trabalhar na minha casa.
Eu estava grávida nessa época, ela acompanhou a gestação inteira. O que era pra ser um "serviço" se transformou numa relação de amizade.
Foi a Maria que cuidou esses 14 anos da minha casa, meu filho, gatos...cuidou de mim.
Ajudou a criar, fez papinha, deu banho, passou roupa, cozinhou, limpou, acolheu, rezou por nós, torceu por nós e até botou fogo na cozinha uma certa vez (uma mero detalhe).
Ela foi mais que uma ajudante. Ela de fato ajudou a vida a ser melhor, mais, organizada, mais leve.
Ela foi braços, ombros, ouvidos, pernas e colo.
Lembro quando cheguei da maternidade com meu filho nos braços e ela o pegou no colo como se fosse dela. Tal foi o carinho, alegria e felicidade dela ao vê-lo.
Até hoje ela dá colo pra ele. Fica triste pra morrer quando brigo com ele. 
Se ele fica amuado ela não sabe o que faz para agradá-lo.
Hoje ele está maior que ela e ela ainda trata ele como bebê. Coisa de mãe.
Como qualquer relação de afeto, de amor, as vezes eles brigam.
Ele implica, ela releva.
Ela brinca, ele esbraveja.
Eles se entendem depois e tudo fica bem.
Eu confio nela. Confiei o meu filho e muito do que ele é também tem dedo dela.
O tempo passou rápido para mim e para ela também.
Ela se separou. Eu me separei.
As filhas dela cresceram, o meu filho cresceu.
A gente confidenciou intimidade, dores, alegrias, amores, a gente escutou uma a vida da outra.
Todo mundo sabe que eu tenho uma Maria. Todos sabem quem ela é, e gostam dela.
Quando me separei minha mãe perguntou:"Quem vai ficar com a Maria?". Porque ela é considerada importante, fundamental.
Eu fiquei com a Maria.
E na separação quem me ajudou a mudar foi ela. Tanto na mudança física, como na mudança interna ela ajudou.
Nós, eu, ela, e o Arthur (meu filho) fizemos a mudança. Seis viagens de carro. Carregando malas, subindo caixa, abrindo coisas, limpando tudo e começando de novo.
Ela foi forte! Quando chorei, sofri, ela deu força, desejou e sempre deseja que eu fique bem. Que eu seja feliz.
Ela teve seus momentos também. Coisas boas e outras nem tanto.
Mas, para nós duas passou, sarou e hoje estamos bem.
Ela viu o Arthur ler, escrever e hoje ficar de recuperação. Faz parte do processo de crescimento.
Olho pra ela e desejo pra ela as mesmas coisas que eu desejo pra mim. Paz no coração, felicidade na vida, amor para seguir junto, saúde pra viver bem, desejo que alguém cuide dela e a valorize pela mulher maravilhosa que ela é.
Já rimos muito. Rimos das fases do Arthur, das graças dele, e das coisas boas e gostosas da vida.
Ela é muito bonita fisicamente, mas, insiste em dizer que está fora do peso.
Minha Maria não é "entrona", faladeira. Ela escuta, conversa e entende que a relação é de respeito e não só de vinculo empregatício.
Não sei se sou boa patroa. Ela diz que sim. Que gosta de mim, da minha casa, meu jeito, gosta do "filho postiço" dela, o meu filho.
Acho que sou uma boa amiga. Gostaria de fazer mais por ela. 
Como na vida tudo são ciclos que começam e que terminam, amanhã será o último dia dela trabalhando na minha casa.
Meu coração está apertado, estou triste, estamos todos. Fico imaginando a minha casa sem ela, meu bom dia sem ela lá passando roupa e me escutando. 
Não quero me despedir. Ela disse que não vai dar adeus.
Pode parecer uma mera relação profissional. Mas, não é. A gente se apega. São os laços invisíveis que acabam transformando as pessoas conhecidas, próximas, em bem mais que isso. É a genética da vida! que faz pessoas comuns serem família. 
Penso nessas mulheres que entram nas nossas casas para limpar, cuidar, cozinhar, e acabam ficando nas nossas vidas para sempre. Nas lembranças, no coração.
Não sei se ainda se usa carta de referência para contratar uma pessoa. Acho que sim afinal, o perigo está de fora para dentro. E muitas vezes entra pela porta da frente.
Pra onde a minha Maria vai ela não precisa de carta de referência. Porque ela vai cuidar de uma tia doente que a conhece bem.
Mas, se ela precisasse seria capaz de inventar coisas absurdas sobre ela só pra ela ficar com gente. Só para ela continuar sendo a nossa Maria.
As coisas estão mudando. A lei mudou as empregadas domésticas hoje tem direitos. Acho justo, já passou da hora dessas mulheres serem tratadas com respeito e dignidade por um trabalho que não tem valorização.
É difícil arrumar alguém de confiança, alguém capacitada pra fazer coisas simples como um bom feijão, ou coisas bem complicadas como cuidar de uma criança, ou ainda escutar uma moça com uma cabeça maluca, um coração açúcarado que tem um blog. 
Digo que Amélias existem, mas, elas estão repaginadas. Hoje acumularam funções. Trabalham dentro e fora de casa.
Mas, Maria está em extinção. Maria como a minha Maria é artigo de luxo, é edição limitada. São dessas coisas raras e especiais.
Amanhã é o último dia dela em casa. Mas, a porta estará sempre aberta.
A porta estará esperando ser aberta de novo qualquer dia desses para um café da tarde e um papo entre amigas.
Eu vou torcer por ela sempre.
*Maria, hoje te digo a segunda palavra que eu mais gosto, que eu acho mais bonita... Obrigada!
Não há dinheiro que pague cuidado, carinho, dedicação, não vai haver nunca, apenas gratidão.

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Marcela Moretto

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Uma mulher, uma menina, uma criança...tentando aprender.